sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Dama de ferro africana



Em África, factores socioculturais, agravados por um contexto altamente desfavorável, tornam o espaço público uma «reserva» quase exclusivamente masculina, reforçando a tese que indica os cuidados com o lar, a família e os filhos como tarefas essencialmente «femininas». No entanto, a situação tende a mudar, talvez mais aceleradamente do que alguns imaginam.

Hoje, África tem a sua «dama de ferro» uma mulher africana de 66 anos, mãe de quatro filhos e com seis netos: a economista Ellen Sirleaf-Johnson Presidente da Libéria, a primeira mulher a assumir o cargo em África. Ao ser eleita, a «dama de ferro» do continente – como passou a ser conhecida – inscreveu o seu nome na restrita lista de 13 mulheres que exercem a função de Presidente ou Chefe de Governo em todo mundo.

A participação de inúmeros Chefes de Estado africanos e representantes de Governos de todo mundo atestou a importância da cerimónia de investidura desta descendente de ex-escravos americanos. De igual modo, a presença de Condolezza Rice, secretária de Estado norte-americana e de Laura Bush, primeira-dama dos EUA, deu um indicativo não apenas da atenção estratégica que a maior potência mundial dedica a esta nação africana, mas também da sua valorização do imenso significado simbólico do acontecimento.

Incumbida de administrar um país devastado por uma guerra civil de 14 anos, a Presidente da Libéria adoptou como prioridade a luta contra a corrupção. Um dos primeiros sinais de que o rótulo de «dama de ferro» tinha razão de ser, foi a corajosa decisão de demitir todos os funcionários do Ministério das Finanças, impondo aos que quisessem regressar a realização de testes de aptidão. A ousadia de ordenar auditorias a todos os ministérios no intuito de esclarecer sinais de corrupção envolvendo ex-ministros e altos funcionários suspeitos de desvios de bens públicos insere-se entre as medidas imediatas tomadas por Ellen Sirleaf-Johnson.

Ao que tudo indica, apostar na competência e qualificação técnica afigura-se como uma das armas escolhidas por esta mulher para vencer o desafio de recuperar o país fragmentado em todos os sectores. Não lhe faltam, para isso, capacidades e experiência administrativa. O impressionante currículo da economista formada em Harvard, antiga ministra das Finanças no Governo do Presidente William Jolbert Júnior nos anos setenta, inclui os cargos de funcionária sénior do Banco Mundial e directora do Bureau regional da Agência de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) para África, depois de ter sido durante seis anos (1986-1992) vice-presidente do Comité Executivo do Equator Bank, em Washington.

Sentenciada a dez anos de prisão durante o regime de Samuel Doe, que, em Abril de 1980, liderou um Golpe de Estado contra William Tolbert, Ellen Johnson-Sirleaf ficou encarcerada por um curto período, regressando posteriormente ao exílio. Em Setembro de 1990, Samuel Doe foi deposto e assassinado por Charles Taylor, ficando assim criadas as condições políticas para o retorno da «dama de ferro» ao seu país, o que aconteceu em 1997. Nesse ano defronta o novo homem forte do país, para quem perde as eleições presidenciais.

Ellen Johnson-Sirleaf disputou a presidência com o ex-futebolista George Manneh Weah, do Paris Saint Germain e do AC Milan da Itália tendo convencido o eleitorado na segunda volta, tendo sido declarada vencedora a 23 Novembro de 2005. Os traços da biografia e trajectória política da Presidente da Libéria contradizem uma realidade que, em diversas partes do mundo, subalterniza a mulher e restringe a sua participação em diferentes sectores da vida social.


Adaptado de As mulheres africanas e o Poder

1 comentário:

Jonathan McCharty disse...

Ola Mitumwane (e' fascinante a forma criativa dos nomes das autoras deste blog. Ja' agora, o que significa?)

Parabens pelo excelente artigo, particularmente pelo aspecto galvanizador que pode incutir nas mentes femeninas, muitas das vezes refens do conformismo e limitacoes.

E' fundamental que a governacao africana comece a basear-se em qualidades, competencia e capacidade de actualmente fazer com que as coisas acontecam e e' importante que esse sinal esteja a ser dado por uma "presidenta".

Ao contrario do que pareca, Africa e' um continente muito tolerante a ascencao feminina aos orgaos directivos, mas e' preciso que voces trabalhem para tal e justifiquem a aposta que e' em vos depositada.

Se nao estou errada, li algures que a presidente e' descendente de comerciantes de escravos e nao de ex-escravos. Gostaria desse esclarecimento.
Abraco e bom weekend.