Não sou adepto de enxergar o mundo como se fosse a primeira vez, muito menos enxergar o mundo como a última vez. Não caio na conversa fiada de estréia e de despedida. Despedir não é terminar - é procurar iniciar de um jeito diferente. Sou homem do durante. Do meio. Do decorrer.
Nada contra quem pensa o contrário, mas é um pouco de soberba inaugurar ou fechar o mundo. Quando se ama uma mulher, é preciso a safadeza, a vontade sem pudor, o desejo diabólico, a tara. Não se conter, não se represar. A ânsia, a violência e a obsessão são permitidas. Mas tudo será grosseria desacompanhada da pureza. Pureza é autenticidade. Não fingir, não disfarçar, não dizer o que não está sentindo.
Já ouvi muito que sexo não é seguir a cabeça e deixar as coisas aconteceram. Sexo seria não pensar. Não concordo, sexo não é inconseqüência, é conseqüência da gentileza. Conseqüência de ouvir o sussurro, de ser educado com o sussurro e permanecer sussurrando. Perder o pudor, não perder o respeito. Perder a timidez, não perder o cuidado. Sexo é pensar, como que não? E fazer o corpo entender a pronúncia mais do que compreender a palavra. Como se não houvesse outra chance de ser feliz. Não a derradeira chance, e sim a chance. Uma mulher está sempre iniciando o seu corpo. Toda a noite é um outro início. Toda a noite é um outro homem ainda que seja o mesmo.
Não se transa com uma mulher pela repetição. Seu prazer não está aprendendo a ler. Seu prazer escreve - e nem sempre num idioma conhecido. Ela pode ficar excitada com uma frase. Não é colocando de repente a mão na coxa. Ela pode ficar excitada com uma música ou com uma expressão do rosto. Não é colocando a mão na sua blusa. Mulher é hesitação, é véspera, é apuro do ouvido. Antever que aquelas costas evoluem nas mãos como um giz de cera. Reparar que a boca incha com os beijos, que o pescoço não tem linha divisória com os seios, que a cintura é uma escada em espiral.
É comum o homem, ao encontrar sua satisfação, recorrer a uma fórmula. Depois de sucesso na intimidade, acredita que toda mulher terá igual cartografia, igual trepidação. Se mordiscar os mamilos deu certo com uma, lá vai ele tentar de novo no futuro. Se brincou de chamá-la de puta, repete a fantasia interminavelmente.
Assim o homem não vê a mulher, vê as mulheres e escurece a nudez junto do quarto.
Amar não é uma regra, e sim onde a regra se quebra.
Não se come uma mulher, ela é que se devora.
3 comentários:
Grande lição, Avid! Se os moços não gazetassem, muita mulher seria plenamente feliz
Hehehe... concordo com a Xim, leiam, manos, e aprendam...
(Nao acham interessante a escassez de comentários?)
Avid, assustaste os manos!
Algures na cidade do Maputo ouvi alguém, a propósito duma doença que o impedia de beber, afirmar: “meus caros vou dar prazo à doença”
Pois eu decidi também dar prazo aos comentadores e, confesso, fiquei surpreendido com esta ausência
Sim, até parece que nós, homens, batemos em retirada!
Eu queria dizer apenas que achei muito interessante o texto e penso que, muito boa gente, se revê nele.
Ao escurecer a nudez, o homem ensaia uma fuga para a frente? Será?
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